No dia 21 de setembro de 2014, neste mesmo espaço, publiquei “Rio Grande do Norte de quase meio milhão de analfabetos”. Hoje o meu incômodo é duplo: de cidadã e gestora pública. Naquela ocasião, assim me expressei:

“Setembro não tem sido de boas notícias para a educação do Rio Grande do Norte. No início do mês o Índice de Desenvolvimento da Educação Básica (IDEB) posicionou o ensino médio do estado na segunda pior colocação e o ensino fundamental na terceira, considerando o ranking das unidades da federação”.

Agora é a Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios (PNAD) 2013, elaborada pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE) que denuncia o ápice de uma tragédia: 494 mil potiguares, com 10 anos ou mais, ainda não sabem ler nem escrever, ou seja, são analfabetos absolutos.

Em 12 anos, período entre 2001 e 2013, o número de analfabetos no RN caiu de 20,17% para 14,62% da população. Ainda assim, o estado continua atrás da média do país (7,13%) e da Região Nordeste (13,92) que ainda ostentam percentuais semelhantes aqueles de nações subdesenvolvidas, enquanto em outros países da América do Sul, como Chile e Argentina, a mesma taxa é inferior a 3%.

No RN, embora pouco expressiva e impactante, a variação positiva, provavelmente, decorre muito mais da elevação da taxa de escolarização das crianças do que dos já manjados programas de alfabetização de jovens e adultos. A pesquisa mostra que entre as crianças de 4 e 5 anos, a escolarização, no estado potiguar, alcançou 89,7% em 2013, o quarto estado nordestino com melhor desempenho, tendo superado a média nacional de 81,2%. A maior taxa de escolarização do País ocorre entre crianças de 6 a 14 anos, faixa na qual o percentual atinge 98,4%. No RN, esse número foi de 98,7% em 2013, repetindo o quarto lugar da região.

Logo, não é suficiente a garantia de acesso à escola. O direito de permanecer e de aprender na época apropriada é o primeiro passo para combater o analfabetismo e alcançar um bom desempenho nos mais distintos indicadores educacionais. Neste sentido, se espera que a gestão estadual coordene um amplo programa que envolva pactuar com a sociedade e com os governos federal e municipais, de modo a atingir 100% das crianças e adolescentes, dos 4 aos 17 anos, na escola; e os que estão além dessa faixa etária, não alfabetizados, precisam ser inseridos em projetos de alfabetização.

Para atingir a meta de alfabetizar 100% da população é oportuno começar pelo cumprimento da Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional, que no parágrafo 1º do seu artigo 5º estabelece que “Compete aos Estados e aos Municípios, em regime de colaboração, e com a assistência da União: I – recensear a população em idade escolar para o ensino fundamental, e os jovens e adultos que a ele não tiveram acesso; II – fazer-lhes a chamada pública […].”

Aqui estamos a defender uma ampla campanha que chame, convoque, mobilize, motive, corresponsabilize a população na tarefa de acessar a escola, de matricular crianças e jovens ou mesmo solicitar uma vaga para si. O valor simbólico do conhecimento, a importância de decifrar os códigos da língua materna, não se constrói sem referências positivas e estímulos externos.

É evidente que alfabetizar meio milhão de pessoas não é uma tarefa para projetos pontuais, desarticulados, isolados no âmbito de uma secretaria de educação. Escolas, igrejas, centros comunitários, clubes de mães, canteiros de obras, fábricas, presídios, centros comerciais, sindicatos, rádios, canais de TV, entre outros, sem desconsiderar as iniciativas de pessoas, individualmente, continuam a ser imprescindíveis nessa tarefa grandiosa.

Além de alfabetizar os que estão com 10 anos ou mais, um desafio não menos importante é o de tornar a escola eficiente para não transformar crianças em jovens e/ou adultos analfabetos, alimentando uma “fábrica” perversa, capaz de produzir em série uma realidade que irriga as estatísticas que nos impõe vergonha.

Sensibilizar e agregar é o que há de mais caro para se construir uma história diferente daqui por diante.”

Agora estou eu, em equipe, na Secretaria de Estado da Educação e da Cultura do Rio Grande do Norte, na tarefa de gestar e dar vida a projetos que materializem tais ideias, tão urgentes quanto garantir que a escola publica funcione com a decência que as crianças e os jovens merecem, desde sempre.

Texto escrito em julho de 2016.

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